Do sonho rasgado pela janela, do tempo perdido pelos
ponteiros sem horas, do sonho fugido e escapado, das mãos covardes frente o
tempo voraz que nos devora...nos empurra mais para perto dos dias que um dia
pareciam que nunca iriam chegar... os tempos certos de um sucesso inigualável, com sabor
viril de vitória na boca...os dias de gloria que não estão lá...no aqui e no
agora... os aplausos surdos de uma vida desperdiçada!
Ele era de um frescor invejável, uma potência de querer
acima dos sóis desgarrados das nuvens negras, era um menino frente os gigantes invencíveis
com ar de Dom imbatível, com as calças largas de tanto querer ser maior, com os
travesseiros suados de tanto transpirar seu sonho pelos poros cada noite
dormida... as pupilas trincadas pelo brilho de tanto chorar por trás dos olhos a
alegria da certeza que tinha de vencer...tudo e todos... os mais pérfidos e os
mais brandos, a mais odiosa e a mais marota das marolas incansáveis de um mar
cada dia menos profundo...cada hora menos azul... a cada noite menos
sonhador!...
...e os carros eram fortes demais para puxar os cavalos da humildade
de suas pretensões... e os estímulos eram brilhantes demais para não ofuscar o
agora vítreo brilho do seu olhar de pedra lascada... as rodas gigantes de neon
preto e branco, chorando o algodão doce esfarelado pelo ar como as bolhas de sabão
explodidas dentro das infinitas taças que lhe perseguiam ao longo dos anos
intensamente frágeis... os anos das casas sujas de paredes encardidas por memórias
tristes, os anos dos palcos vazios abandonados por memórias inexistentes, os
anos dos encontros marcados fuzilados pelas trincheiras das consequências das
escolhas imutáveis...as memórias inesquecíveis!
Tudo isso passando com a violência tácita de uma apatia
cega, como a chuva passa deixando seu rastro pela mesma autêntica janela dos
seus olhos, do seu quarto, do seu lar... a mesma janela que dá para o mundo lá
fora... arranhada pelo mofo do tempo sem lar... aquele que mora dentro do lugar
que fingimos não existir.... por de trás da máscara das grandiloquentes e
também das órdinarias e cotidianas alegrias... dentro demais para ser somente
uma fase... tempo demais para ser apenas um sintoma.... a doença da
insensibilidade absoluta de uma vida morta... eis o que é! o pássaro falecido dentro de nós..., era ali que doía, era ali que o bico entortava e o zumbido não deixava nada
nunca em paz. Era para lá que todos os sorrisos eram tragados, todas as cores mastigadas, os sabores desmanchados...o ralo, o vórtice,
o fim do mundo dentro da alma.... era ali que estava germinado o silêncio
ensurdecedor, e a vontade da não vontade, era ali onde o calor dos gestos se
derretiam em gelo...a janela quebrada e o calar das notas de um piano mudo também dormiam ali!... nesse lugarzinho maldito dentro de nós...para quando nós somos
eu...para quando eu sou esse lugar medonho e dolorosamente assustador... um
nada, um pedacinho minúsculo de terra dentro do quase infinito jardim, pelo
menos era assim, há anos atrás, tão minúsculo, tão inofensivo, tão fácil de se
subestimar...! e sim, agora me deparo com os vidros da janela quebrados pelo chão... todos eles,
cortando os pés descalços sujos de terra molhada...o gosto da chuva esfumaçada perdido pela paisagem tumular...por ali, perto da grama
verde de uma esperança jovial, ingênua, quase infantil...! ele era sempre tão pequeno... mas já grande demais para crescer, ou para além dos dias mortos e dos tempos sem
horas, ter cavado uma discreta cova...!
Nesse lugarzinho tem uma lápide branca e um corvo negro sobre seu busto secular...e talvez, nesse lugar onde sem querer enterramos o nosso sonho, haja ainda mais um lugar... que nos treme, e ainda nos mata um pouco mais... um lugar, ao lado da lápide dos sonhos, para ali também se deitar o amanhã, o tal dia da vitória um pouco mais amarga e já não mais tão espontânea... tão pura! o dia em que voltaremos a sonhar!
Nesse lugarzinho tem uma lápide branca e um corvo negro sobre seu busto secular...e talvez, nesse lugar onde sem querer enterramos o nosso sonho, haja ainda mais um lugar... que nos treme, e ainda nos mata um pouco mais... um lugar, ao lado da lápide dos sonhos, para ali também se deitar o amanhã, o tal dia da vitória um pouco mais amarga e já não mais tão espontânea... tão pura! o dia em que voltaremos a sonhar!
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